Mais da metade dos clubes do Campeonato Brasileiro pede mudanças no VAR

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Agência Estado – Foto: Fernando Torres/CBF

Após o primeiro turno de utilização do VAR (árbitro de vídeo) no Campeonato Brasileiro, mais da metade dos clubes da Série A defende mudanças. O pedido principal é a liberação das imagens revistas no vídeo e do áudio das conversas entre o árbitro de campo e os auxiliares da cabine. Os cartolas também querem que os torcedores no estádio saibam o que está sendo analisado. Para eles, a tecnologia só deve ser usada para reverter uma decisão caso a marcação do juiz no gramado seja um erro claro.

A reportagem consultou os 20 clubes da elite do futebol brasileiro sobre o árbitro de vídeo. Doze se pronunciaram, propondo alterações. Foram eles: Atlético-MG, Bahia, Ceará, Fortaleza, Goiás, Internacional, Chapecoense, Avaí, Palmeiras, Vasco, Fluminense e Flamengo. Oito não quiseram se manifestar sobre o VAR (Corinthians, São Paulo, Santos, Grêmio, Cruzeiro, Botafogo, Athletico-PR e CSA).

“Não vejo porque os diálogos não serem habitualmente mostrados e as imagens também, mesmo que seja para reconhecer erros. Afinal de contas não existe sistema que não tenha erros. A transparência na nossa visão vai servir para defender o árbitro de vídeo e não prejudicá-lo”, disse Guilherme Bellintani, presidente do Bahia.

Embora não tenha se posicionado oficialmente, o Corinthians realizou palestra para os jogadores ressaltando a importância do VAR. O presidente da Comissão Nacional de Arbitragem da CBF, Leonardo Gaciba, visitou o clube na semana passada e tirou dúvidas dos atletas. “A reunião serviu para que membros de comissão técnica e atletas entendessem mais sobre novas regras e sobre como operam na checagem dos lances para que todos tenham melhor compreensão das mudanças”, comentou o gerente de futebol do Corinthians, Vilson Menezes.

Existem quatro tipos de lances que podem ser analisados pelo VAR, segundo o Conselho da Federação Internacional de Futebol (Ifab, na sigla em inglês): se foi gol ou não, se houve pênalti, erro de identificação para aplicar um cartão e se a jogada foi ou não para vermelho direto. “O Atlético-MG considera que a publicação e a publicidade de áudios e vídeos do VAR são a chave do processo. Isso é fundamental”, opinou Lásaro Cândido da Cunha, vice-presidente do Atlético-MG.

Posição da CBF

A CBF ainda não se manifestou oficialmente sobre as reclamações dos clubes. Em evento realizado em agosto, a entidade sinalizou que deverá atender boa parte das solicitações a partir da primeira rodada do returno, marcada para o próximo final de semana. A entidade anunciou que as revisões do VAR terão as imagens liberadas para quem acompanha os jogos pela TV. Quem estiver no estádio também poderá ver o vídeo utilizado para a análise do árbitro logo após a revisão dos lances. Por outro lado, os áudios com as conversas entre o juiz de campo e o da cabine devem continuar restritos à equipe de arbitragem.

Marcelo Segurado, diretor de futebol do Ceará, propõe que os clubes tenham direito a solicitar o uso do VAR. “Seria interessante que houvesse uma ou duas solicitações ou do treinador ou do capitão da equipe em cada tempo do jogo”, avaliou o dirigente.

Guilherme Bellintani retoma uma discussão antiga na arbitragem brasileira: a questão da profissionalização. “A profissionalização da arbitragem é o passo necessário para que o árbitro de vídeo seja mais bem utilizado. A profissionalização traz com ela mais formação, mais capacidade de análise, enfim, qualidade técnica geral.”

O maior problema tem sido a demora para tomada de decisão no gramado. No empate entre Palmeiras e Bahia, pela 14ª rodada do Brasileirão, dois pênaltis foram marcados para a equipe baiana após o mineiro Ricardo Marques Ribeiro, árbitro de vídeo, acionar o conterrâneo Igor Benevenuto em campo. Em cada uma das vezes, cerca de cinco minutos foram gastos para que um consenso fosse tomado sobre as infrações. A partida teve uma duração total de 110 minutos – 20 a mais do que o tempo regulamentar. “O tempo que se toma a decisão tem de ser reduzido”, disse Mauricio Galiotte, presidente do clube alviverde.

O clube paulista se considera pioneiro na discussão sobre o uso do VAR. Na final do Campeonato Paulista de 2018 contra o Corinthians, o Palmeiras alega que houve interferência externa para ajudar o árbitro Marcelo Aparecido de Souza a marcar e, depois de oito minutos, cancelar um pênalti de Ralf no atacante Dudu, no segundo tempo da decisão. Depois de o STJD negar, por unanimidade, o pedido de impugnação da final, o clube paulista desistiu de recorrer à Corte Arbitral do Esporte (CSA, na sigla em inglês), a última instância do direito esportivo.

Confira o que disseram os representantes dos clubes:

Guilherme Bellintani, presidente do Bahia – “A profissionalização da arbitragem é o passo necessário para que o árbitro de vídeo seja mais bem utilizado. A profissionalização traz com ela mais formação, mais capacidade de análise, enfim, qualidade técnica geral. E a segunda coisa é transparência. Não vejo porque os diálogos não serem habitualmente mostrados e as imagens também, mesmo que seja para reconhecer erros”.

Lásaro Cândido da Cunha, vice-presidente do Atlético-MG – “O Atlético considera que a publicação e a publicidade de áudios e vídeos do VAR é a chave do processo. É fundamental. Não é possível a CBF ficar em conta gotas. Por outro lado, as pessoas que operam o árbitro de vídeo e também os árbitros de campo têm de ter uma formação mais adequada”.

Marcelo Segurado, diretor de futebol do Ceará – “Transparência na divulgação dos vídeos e áudios para que possa saber o que foi conversado. Outra situação é que houvesse em cada tempo uma ou duas solicitações ou do treinador ou do capitão da equipe. Outro ponto: todos são expostos aos erros: treinador, jogador presidente e diretor, menos o árbitro. A solicitação é de que árbitro de campo e de VAR participem de coletivas após os jogos.”

Marcelo Paz, presidente do Fortaleza – “Quanto mais clareza, melhor. Este é o ponto. Se o porquê das decisões fosse informado seria melhor. É possível usar isso de forma transparente. Os protocolos precisam ficar cada vez mais claros. Depois que recebemos a visita do Gaciba (Leonardo Gaciba, chefe de arbitragem da CBF) aqui no Fortaleza foi muito esclarecedor. Depois disso, entendemos melhor o motivo de algumas decisões. Isso faz com que o VAR tenha mais credibilidade. Se os próprios jogadores não conheciam muito bem, imagina o público em geral”.

Túlio Lustosa, gestor de futebol do Goiás – “Maior agilidade nas decisões, menos interferências em lances interpretativos e principalmente que os assistentes só deixem de levantar a bandeira realmente na dúvida do impedimento (muitos lances de impedimento claro os assistentes estão deixando o lance ‘correr’ para depois levantar a bandeira)”.

Marcelo Medeiros, presidente do Internacional – “O VAR é uma realidade que veio para ficar. O uso da tecnologia, a exemplo de outros esportes, contribui com o aprimoramento do futebol. Acho que a transparência é importante. A gente ter acesso aos áudios é um passo que pode ampliar a transparência – não que as coisas sejam obscuras, mas que a gente entenda o que aquela comissão de árbitros de vídeo está repassando ao árbitro de campo. Acho que quanto maior transparência, melhor. Mas não sei se (liberar imagens e áudio) no dia do jogo é o melhor momento”.

Plinio David de Nes Filho, presidente do Chapecoense – “Eu defendo o VAR desde o primeiro dia aqui na CBF. Sou um entusiasta do VAR, porque venho do vôlei e do tênis, onde ele apresenta resultado muito bem. Tivemos dificuldade de entendimento, mas está melhorando com o passar do tempo. Tem de ser um veículo que transmita paz nos estádios, que o torcedor entenda que aquilo foi real. As coisas precisam ser bem clareadas. Acho que tem de liberar tudo. No momento que libera as imagens, libera os áudios”.

Francisco José Battistotti, presidente do Avaí – “O clube entende que o VAR precisa ser melhorado. Ganho de velocidade na avaliação dos lances em verificação. Criar um mecanismo claro como o futebol americano, onde o árbitro fala ao microfone para o estádio a decisão tomada, com o lance no telão. Mas a liberação do áudio da conversa dá transparência para as decisões tomadas”.

Mauricio Galiotte, presidente do Palmeiras – “O Palmeiras é 100% favorável à tecnologia, ao uso do VAR. A tecnologia tem como princípio a justiça, então a gente entende que ela é benéfica e temos de lutar por isso. Entretanto, o que a gente acha é que é uma ferramenta que merece ajustes. O tempo que se toma a decisão tem de ser reduzido. Acho que as imagens que estão sendo analisadas no momento do VAR deveriam ser expostas ao público, e também talvez o áudio pudesse ser divulgado”.

Alexandre Campello, presidente do Vasco – “Acho que não só deveria liberar os áudios do VAR, como deveria ser informado ao público do estádio o que está sendo analisado, para dar mais transparência. Estive aqui na CBF em dois momentos porque achei que o Vasco havia sido prejudicado em dois lances. Mas, ao ver o trabalho do pessoal do VAR e ser apresentado à lógica e às imagens dos lances – que a gente não tem às vezes quando está assistindo pela televisão -, eu acabei concordando com a arbitragem”.

Mario Bittencourt, presidente do Fluminense – “O Fluminense é a favor do VAR, desde que mudem os critérios de avaliação. Acho que hoje estão equivocados e precisam melhorar. É lógico que a gente é a favor da tecnologia, mas a gente acha que está sendo mal operado pelas pessoas. A gente já fez três ofícios criticando algumas situações em que a gente acha que o critério foi ruim. Tem de liberar imagem e áudio”.

Flamengo – “O clube considera que o VAR está cumprindo sua função e melhorou o futebol de forma geral. Entendemos que alguns pontos podem evoluir, como a uniformidade de critério, e encontrar formas de acelerar as decisões do VAR para tornar o jogo mais fluido e contínuo”.